A origem: Do negócio e do preconceito
“Brechó só tem roupa de defunto”, “coisa usada não presta mais para nada”, “comprar peça de outra pessoa traz energia negativa”… BASTA!
Quem nunca ouviu essas e outras frases depreciativas sobre os nossos queridos brechós? Infelizmente, ainda existem pessoas com esse tipo de pensamento carregado de preconceito em nossa sociedade.
Para entendermos melhor a origem dessas prerrogativas, vamos direto à fonte da história: Originalmente chamado “Marché aux puces”, o Mercado de Pulgas surgiu oficialmente em 1885 nos subúrbios de Paris, na França, como um grande bazar ao ar livre, que comportava a venda de vestuários que, na época, muitas vezes vinham infestados de pulgas.
Pouco a pouco essa prática foi se difundindo pelo mundo, especialmente nos Estados Unidos, onde ficou conhecido como “Flea market”, acomodando trocas das mais diversas possíveis e a venda de bens antigos, usados e outras mercadorias. Por esse motivo, as ideias de sujeira, má qualidade e até problemas espirituais permearam muito tempo sendo ligadas ao mercado de segunda mão.

Foto: Office de Tourisme de Plaine Commune Grand Paris
Mercado de segunda-mão verde, azul e amarelo
Em terras brasileiras, conta-se que os brechós tenham surgido por volta do século XIX, devido a um mascate que se chamava Belchior que era conhecido por vender itens usados no Rio de Janeiro.
Os estabelecimentos que faziam isso também eram chamados de “belchior” e mais tarde adaptou-se o nome brechó, termo esse que é citado no livro “Idéias de Canário” de Machado de Assis. O escritor descreve o impacto do personagem ao ser “atirado” na loja de Belchior e sua reação de desdém ao adentrar um mundo “desorganizado”, “sujo”, oposto ao seu – organizado, limpo.
Ainda pelas décadas posteriores a publicação do conto, brechós eram erroneamente associados às ideias de “pobreza”, “populacho”, local onde se vendem produtos de qualidade duvidosa.

Foto: Achiote, Revista Eletrônica de Moda
A internet como ferramenta de conscientização
Que os meios de comunicação são extremamente importantes para o acesso à informação, não restam dúvidas. Porém, algo que precisa ser pontuado é que durante os séculos passados eles eram extremamente limitados às elites, o que dificultava o discernimento em tópicos inovadores. Todavia, com os avanços tecnológicos e a invenção e desenvolvimento da internet, as notícias e discussões se tornaram mais popularizadas.
A geração Z (nascidos entre 1995 e 2015), mais atenta às questões do meio ambiente, é a responsável por arrancar qualquer resquício de preconceito que ainda pode existir em relação ao hábito de comprar em brechó. O fato de serem jovens nativos digitais também ajuda.
Segundo a empresa de consultoria norte-americana Boston Consulting Group, os canais digitais foram essenciais nessa mudança de paradigma. O Instagram e o TikTok são duas das principais plataformas de mídia social que têm tido uma grande influência sobre o consumo de segunda mão.
Ambas as plataformas são utilizadas para compartilhar imagens e vídeos de moda, decoração, beleza, entre outros temas que têm como foco a sustentabilidade e a consciência ambiental.

No Instagram, os usuários têm criado perfis dedicados à venda de produtos de segunda mão, onde é possível encontrar desde roupas até objetos de decoração.
Esses perfis têm ganhado popularidade entre os consumidores que procuram itens exclusivos e mais sustentáveis, além de preços mais acessíveis. Já o TikTok tem sido utilizado para divulgar dicas de como encontrar produtos de segunda mão em brechós e lojas de usados.
Através de vídeos curtos, os usuários compartilham suas descobertas e incentivam outras pessoas a experimentar a moda sustentável.
Segundo um relatório divulgado pela ThredUp, as gerações Millenial e Z estão gastando uma grande proporção de seu orçamento de vestimenta em peças second hand do que estavam há cinco anos, o que mostra a grande mudança de comportamento de consumo destas faixas etárias.
70% dos compradores dizem que é mais fácil comprar em brechós agora do que era há alguns anos atrás, graças ao surgimento da tecnologia e mercados online.
A pandemia do COVID-19 acelerou esse processo?
Durante a pandemia, a crise econômica e a inflação levaram o brasileiro a se interessar cada vez mais por itens de segunda mão.
É o que aponta a pesquisa, Brasil Digital: Itens Parados em Casa, que identificou que muitas pessoas encontraram, durante a pandemia, no mercado de seminovos e usados, oportunidades de compras com o melhor custo-benefício, ou de vendas, para gerar renda extra.
Dentre os participantes, 39% afirmaram que já compraram produtos usados e 45% deles tiveram essa primeira experiência durante a pandemia. O resultado mostra também que a pandemia não somente acelerou o hábito de comprar online, como também impulsionou ainda mais o hábito de comprar usados.
A OLX, empresa presente em 45 países e conhecida por incentivar o desapego e o consumo consciente, viu o seu acesso alavancar durante a quarentena.
De acordo com o diretor financeiro da empresa, Joel Rennó, o número de visitantes no Brasil aumentou em mais de 30% e ultrapassou os 8 milhões. Para Rennó, a alta no número dos acessos, neste período, não se dá somente pelo isolamento e pelo fechamento do comércio durante a pandemia, mas também por uma preocupação social: “A pandemia acelerou a ideia de conscientização”.
Perspectivas para o mercado de usados
Brechós existem há muito tempo, mas nunca ganharam tanta relevância no mercado de moda como atualmente. As práticas sustentáveis estão orientando, atualmente, o mundo dos negócios.
A pandemia, as notícias correntes sobre o aquecimento global, a preocupação com os índices de poluição via indústria da moda e a possibilidade de economizar dinheiro são fatores que influenciaram, nos últimos anos, a motivação do consumo de itens de segunda mão.
Segundo uma pesquisa da empresa de análise de varejo GlobalData, estima-se que o valor movimentado pelo segmento em todo o mundo deve ir de US$ 24 bilhões em 2019 para US$ 51 bilhões em 2025, o que equivale a um aumento de 112,5%.
O fato é que a cada ano que passa esse setor de usados se consolida, seja por consciência ambiental, acesso a tecnologia, preços acessíveis, mudanças no comportamento do consumidor ou até mesmo oportunidade de negócio, visto que é possível criar um empreendimento desse nicho sem grandes investimentos iniciais.
Para concluir, trago uma reflexão: Você já pensou em separar as suas roupas e objetos que não tem mais interesse e colocar para venda? Ou já pensou em deixar de comprar em uma loja de fast fashion e garimpar peças em brechós? Veja que hábitos sustentáveis não são difíceis de implementar na nossa vida. Você pode ainda economizar e contribuir para um mundo mais verde! Lembre-se sempre: O produto mais sustentável é aquele que já existe!

Referências:
- Achiote, Revista Eletrônica de Moda
- Blog Império Retrô
- Canal Tech
- Conceito.De
- Office de Tourisme de Plaine Commune Grand Paris
- Portal da Floresta
- Portal Metrópoles
- Portal Witri
- Revista Elle Brasil